Ficar mais calado, perder o interesse pelas pequenas coisas ou afastar-se das pessoas de quem se gosta… À primeira vista, pode parecer “coisa da idade”. Mas, muitas vezes, é mais do que isso. A depressão nos idosos existe – e nem sempre se vê à primeira. Os sinais podem ser discretos, confusos, até silenciosos. Mas o impacto é real e profundo.
Tantas vezes confundida com o “normal” do envelhecer, que acaba por ficar escondida. Mas não devia. Porque o sofrimento é real e tratar a depressão pode devolver sentido, prazer e até esperança a quem já achava que os melhores dias tinham ficado para trás.
Pontos-chave do artigo
- A depressão não é uma consequência natural do envelhecimento e pode passar despercebida nos idosos
- Os sintomas nem sempre incluem tristeza — podem surgir como dores físicas, apatia ou isolamento
- Fatores como solidão, doenças crónicas e perda de autonomia aumentam o risco
- O diagnóstico precoce e o tratamento adequado (medicação, psicoterapia e apoio social) melhoram significativamente a qualidade de vida
- Prevenir passa por promover um estilo de vida ativo, saudável e com ligação à comunidade
- Existem linhas de apoio disponíveis para quem precisa de ajuda ou orientação.
O que é, afinal, a depressão na terceira idade?
A depressão não é apenas uma fase de tristeza, nem um sinal de fraqueza. É uma perturbação emocional profunda que afeta a forma como a pessoa pensa, sente e vive. E quando surge na terceira idade, pode ser ainda mais difícil de reconhecer, tanto para quem sente, como para quem está por perto.
Muitas vezes, não se manifesta com lágrimas ou palavras tristes, mas sim com silêncios prolongados, dores sem causa, cansaço constante ou uma apatia que vai tomando conta dos dias. Em vez de dizerem que estão tristes, muitos idosos dizem apenas que estão cansados, que têm dores ou que já não têm paciência para nada. É por isso que tantos sintomas acabam por ser confundidos com o “normal” do envelhecer – e passam despercebidos.
Quais são os países que mais sofrem com a depressão?
Um estudo do DREES, com base no Inquérito Europeu de Saúde por Entrevista (EHIS) de 2019, revelou que França tinha, antes da pandemia, a maior taxa de depressão da Europa, com cerca de 11% da população afetada.
Já Portugal apresentou uma das taxas mais elevadas de depressão crónica, segundo o Eurostat, com 12,2% da população a reportar sintomas, ultrapassado apenas pela Eslovénia. Mais recentemente, um relatório da OCDE, de 2023, reforça que Portugal está entre os países com níveis mais altos de ansiedade e depressão na União Europeia.
Porque é que a depressão atinge tantos idosos?
A verdade é que o envelhecimento traz mudanças profundas: a perda de amigos ou do parceiro de vida, a reforma, o isolamento social, o aparecimento de doenças crónicas ou a sensação de que já não se “pertence” ao mundo ativo. Tudo isto pode afetar profundamente a saúde mental.
Em Portugal, de acordo com dados analisados até 2023, estudos indicam que cerca de 15% dos idosos podem ter sintomas depressivos. E este número sobe para 30% em ambientes de institucionalização, como lares ou hospitais.
É também mais comum entre mulheres mais velhas e entre idosos com múltiplos problemas de saúde. Mas não é inevitável. E não deve ser ignorado.
Sintomas de depressão no idoso: o que observar
Os sinais nem sempre são os clássicos e há também casos em que a depressão se confunde com demência, sobretudo quando há esquecimentos, lentidão no raciocínio e desorientação.
Eis alguns dos sintomas mais comuns na terceira idade:
- Isolamento social e falta de interesse em estar com outras pessoas
- Fadiga constante ou falta de energia
- Dores físicas sem explicação médica
- Insónia ou excesso de sono
- Perda ou aumento significativo de peso
- Dificuldade em concentrar-se ou em tomar decisões
- Sentimentos de culpa ou inutilidade
- Pensamentos recorrentes sobre a morte.

Quais são os principais fatores de risco?
A depressão na terceira idade raramente tem uma causa única. Muitas vezes, nasce do acumular de perdas, mudanças e silêncios. É o corpo que enfraquece, a solidão que cresce, a vida que abranda. São fatores biológicos, psicológicos e sociais que, juntos, tornam os dias mais difíceis de enfrentar.
Nos idosos, os mais comuns são:
- Perda do cônjuge ou de amigos
- Reformar-se e perder o propósito ou rotina
- Viver sozinho ou com pouco apoio familiar
- Problemas económicos ou dificuldades em manter a autonomia
- Doenças crónicas como diabetes, AVC ou doenças cardíacas
- Uso prolongado de certos medicamentos
- História prévia de depressão.
Como diagnosticar e tratar a depressão no idoso?
A boa notícia? Sim, a depressão tem tratamento, mesmo nos idosos.
O primeiro passo é reconhecer os sintomas e procurar ajuda médica. O diagnóstico é clínico, feito através da avaliação dos sintomas e, por vezes, com o apoio de escalas validadas para a população idosa.
Depois, o tratamento pode passar por:
- Medicação antidepressiva, sempre ajustada à idade e às outras condições de saúde
- Psicoterapia, nomeadamente a terapia cognitivo-comportamental, que tem mostrado bons resultados
- Atividade física regular, que ajuda a libertar hormonas ligadas ao bem-estar
- Socialização e participação em atividades, para quebrar o isolamento
- Intervenção familiar e comunitária, essencial para criar um ambiente de apoio e segurança.
Em casos mais graves ou resistentes, pode considerar-se o recurso a terapias como a eletroconvulsiva (TEC) ou a estimulação magnética transcraniana.
Prevenção: pequenas mudanças que fazem a diferença
É possível prevenir (ou pelo menos reduzir) o risco de depressão na terceira idade. Como? Através de hábitos e rotinas saudáveis:
- Incentivar a prática regular de exercício físico, mesmo que leve
- Manter uma alimentação equilibrada
- Criar rotinas que incluam momentos de prazer, convívio e propósito
- Fomentar a participação em atividades culturais, recreativas ou de voluntariado
- Acompanhar regularmente a saúde física e mental.
O mais importante? Estar presente. Ouvir. Validar os sentimentos. E agir perante sinais de alerta.
Como ajudar um idoso com depressão?
Ajudar um idoso com depressão começa com algo simples, mas essencial: estar presente. Muitas vezes, o maior gesto é ouvir sem julgar, mostrar que se está ali, mesmo quando as palavras faltam. Mas há mais que se pode (e deve) fazer.
- Levar a sério os sinais. Mudanças de humor, isolamento, queixas físicas constantes ou perda de interesse nas atividades são alertas que não devem ser ignorados
- Incentivar a procura de ajuda profissional. Nem sempre é fácil, mas é fundamental.
- Marcar uma consulta, acompanhar o idoso e mostrar que não está sozinho pode fazer toda a diferença
- Apoiar o tratamento. A depressão pode ser tratada, mas exige acompanhamento.
- Ajudar a manter as consultas, a seguir a medicação e a participar em terapias é uma forma de cuidar ativa
- Promover rotinas e atividades simples. Convidar para um passeio, ver um filme juntos ou até preparar uma refeição pode trazer de volta pequenos momentos de prazer
- Evitar minimizar os sentimentos.
- Frases como “isso passa” ou “tens de reagir” podem aumentar o sentimento de incompreensão. É melhor escutar e validar o que o idoso está a sentir
- Fomentar o contacto com outras pessoas. A socialização é uma ferramenta poderosa.
- Incentivar o convívio com amigos, familiares ou grupos comunitários pode quebrar o ciclo do isolamento.
Sobretudo, é importante lembrar que a depressão não é uma falha, é uma doença. E como qualquer outra, merece atenção, empatia e tratamento. Quanto mais cedo se agir, maiores são as hipóteses de recuperar qualidade de vida.
E quando é preciso apoio extra?
Há momentos em que, por mais que a família e os amigos estejam por perto, não chega. Quando o sofrimento se torna mais pesado, é importante saber que existem mãos estendidas, prontas a ouvir, orientar e apoiar, de forma segura e sem julgamentos.
Em Portugal, existem linhas de apoio gratuitas e confidenciais que podem ser uma ajuda preciosa:
- Linha SNS 24 – 808 24 24 24 (com apoio psicológico incluído)
- Linha SOS Voz Amiga – 213 544 545 / 912 802 669 / 963 524 660 (todos os dias das 15h30 às 00h30)
- Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) – 112 (em situações de urgência)
- Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados – Serviço Nacional de Saúde
- Associação Novo Cuidar – apoio domiciliário e acompanhamento personalizado.
Estas estruturas existem para apoiar, orientar e, muitas vezes, salvar vidas.