Há sinais que vamos justificando: “deve ser do stress”, “ando a dormir mal”, “é da idade”. Mas quando a sede não passa, o cansaço se acumula e a visão começa a ficar turva, o corpo pode estar a dizer algo mais sério e a diabetes é uma das possibilidades.
A diabetes é muito mais comum do que se pensa: a nível mundial, estima-se que cerca de 43% dos adultos com diabetes ainda não tenham diagnóstico, segundo o IDF Diabetes Atlas 2025 da International Diabetes Federation. Isto significa que muitos dos sintomas são ignorados ou confundidos com simples cansaço ou desgaste do dia a dia.
Este artigo vai ajudar a reconhecer os sintomas, entender por que surgem e saber quando agir.
Pontos-chave do artigo
- A diabetes pode ser silenciosa ou apresentar sinais claros como sede, urinar muito, cansaço, fome constante e visão turva
- A diabetes tipo 1 surge rapidamente; a tipo 2 evolui devagar e passa facilmente despercebida
- A pré-diabetes é uma fase de alerta que pode ser revertida com mudanças de estilo de vida
- Hiperglicemia (açúcar alto) e hipoglicemia (açúcar baixo) exigem reconhecimento precoce, sobretudo em quem já faz tratamento
- O diagnóstico é feito com análises como glicemia em jejum, HbA1c e TTOG.
O que é a diabetes e porque surgem os sintomas?
Para entender os sintomas da diabetes, basta imaginar que o nosso corpo funciona com energia e essa energia vem da glicose, o açúcar que circula no sangue. Depois de comermos, a glicose aumenta e é suposto entrar nas células para ser usada.
A “porta” que permite essa entrada chama-se insulina, uma hormona produzida pelo pâncreas.
Quando existe diabetes, este processo fica comprometido. E isso pode acontecer de duas formas:
- O corpo deixa de produzir insulina em quantidade suficiente (como no tipo 1)
- Ou as células deixam de responder corretamente à insulina (como no tipo 2), devido à resistência à insulina.
Em ambos os casos, a glicose não consegue entrar nas células e acaba por ficar “presa” no sangue. As células ficam sem energia e o organismo tenta compensar: aumenta a sede, produz mais urina, rouba nutrientes de outros tecidos e altera o funcionamento de vários órgãos.
É esta combinação (glicose a mais no sangue + células a funcionar “em esforço”) que dá origem aos sintomas típicos: sede intensa, cansaço, fome constante, perda de peso, visão turva e, mais tarde, alterações na pele, pés, rins e olhos. Em Portugal, a diabetes é uma das doenças crónicas com maior impacto na população adulta, sendo reconhecida como um dos Programas de Saúde Prioritários pela Direção-Geral da Saúde, através do Programa Nacional para a Diabetes.
Como a glicemia afeta o organismo
Quando a glicose fica demasiado tempo a circular no sangue, o corpo entra em modo de compensação. Primeiro, tenta livrar-se do excesso através da urina, é por isso que surgem a sede constante, a boca seca e a necessidade de urinar mais vezes. Este processo, além de desidratar, faz o organismo perder sais minerais essenciais, o que contribui para a sensação de cansaço e fraqueza.
Se este desequilíbrio se prolongar, o açúcar elevado começa a danificar lentamente os vasos sanguíneos e os nervos. É aqui que surgem consequências mais profundas: a visão torna-se mais sensível, dificuldade na cicatrização da pele, os rins trabalham em esforço e os pés podem perder sensibilidade. A longo prazo, também o coração e o cérebro ficam mais vulneráveis.
Sintomas de diabetes tipo 1: sinais que surgem rapidamente
Com este cenário em mente, começa a ser mais fácil entender porque o corpo reage de determinadas formas. E, na diabetes tipo 1, estas reações não demoram a fazer-se notar. A diabetes tipo 1 costuma aparecer de forma repentina, sobretudo em crianças, adolescentes ou jovens adultos, mas pode surgir em qualquer idade. Como o pâncreas deixa de produzir insulina ao longo do tempo, os sintomas aparecem depressa e com força.
Sede anormal e boca seca
Nada parece matar a sede, a criança ou jovem bebe mais água do que nunca e continua com a boca seca.
Urinar frequentemente e em grande quantidade
As idas à casa de banho aumentam muito, inclusive durante a noite.
Fome constante com perda de peso
Mesmo comendo mais, o peso desce rapidamente, porque o corpo não consegue usar a energia dos alimentos.
Fadiga extrema
Há uma quebra de energia evidente, sonolência e um cansaço que não corresponde ao nível de esforço.
Visão turva
A glicose elevada altera o foco dos olhos, causando momentos de visão desfocada.
Quando estes sintomas vêm acompanhados de náuseas, vómitos, dor abdominal ou respiração acelerada, pode tratar-se de cetoacidose diabética, uma urgência médica.
Sintomas de diabetes tipo 2: sinais mais subtis e progressivos
A diabetes tipo 2 instala-se devagar, muitas vezes ao longo de anos. É comum que os primeiros sinais passem despercebidos e, por isso, a doença pode já estar avançada quando é descoberta.
Sede persistente e boca seca
Um aumento gradual da sede, muitas vezes atribuído ao calor, ao trabalho ou ao stress.
Aumento da frequência urinária
Mais viagens à casa de banho, sobretudo à noite.
Cansaço inexplicável
Um cansaço que não passa com descanso, acompanhado de perda de energia e dificuldade de concentração.
Dormência e formigueiro nos pés e mãos
A glicemia alta afeta os nervos periféricos, causando dormência, “agulhadas” e sensação de queimadura.
Cicatrização lenta
Pequenas feridas que demoram mais do que o habitual a sarar.
Infeções recorrentes
Infeções urinárias, gengivites, candidíase ou infeções de pele podem tornar-se mais frequentes.
Pré-diabetes: sintomas silenciosos que não deve ignorar
A pré-diabetes é um estado de alerta: não é ainda diabetes, mas é sinal de que o organismo já está a ter dificuldade em usar a insulina de forma eficiente. A glicose no sangue sobe de forma discreta, não o suficiente para um diagnóstico de diabetes, mas acima do que seria considerado saudável.
O grande desafio? Quase não dá sintomas.
É por isso que tantas pessoas passam meses ou anos nesta fase sem se aperceberem.
Mesmo assim, o corpo pode deixar alguns recados subtis:
- Um cansaço que parece desproporcionado ao esforço
- Maior tendência para ganhar peso, especialmente na zona abdominal
- Sede um pouco mais frequente ou vontade de urinar ligeiramente aumentada
- Pequenos episódios de visão turva após refeições muito doces
- E, em muitos casos, o aparecimento de acantose nigricans, manchas escuras e aveludadas na pele (geralmente no pescoço, axilas ou virilhas), indicadoras de resistência à insulina.
É nesta fase que a prevenção faz a maior diferença. A pré-diabetes pode ser reversível ou estabilizada com pequenas mudanças no estilo de vida: mais movimento, pequenas perdas de peso, ajustes na alimentação e rotinas mais equilibradas. Quanto mais cedo for identificada, maior a probabilidade de travar a evolução para diabetes tipo 2.
Valores de glicemia entre 100–125 mg/dL
Quando a glicemia em jejum fica entre 100 e 125 mg/dL, o organismo já está a dar um sinal de alerta. Estes valores não são altos o suficiente para um diagnóstico de diabetes, mas também já não estão dentro da normalidade. É a chamada pré-diabetes, uma fase intermédia em que o açúcar no sangue começa a subir porque o corpo está a ter dificuldade em usar a insulina como deve ser.
De forma simples:
- Abaixo de 100 mg/dL: considerado normal
- 100–125 mg/dL: pré-diabetes (fase de risco)
- 126 mg/dL ou mais: provável diabetes (precisa de confirmação).
Sintomas de hiperglicemia: quando o açúcar está elevado
A hiperglicemia pode acontecer antes do diagnóstico ou em pessoas já tratadas mas com descontrolo glicémico.
Sinais que podem surgir
- Sede intensa
- Boca seca
- Visão turva
- Cansaço marcante
- Urina abundante.
Na maioria das vezes, estes sintomas aparecem juntos e são um sinal de que a glicose está muito acima do desejável.
Sintomas de hipoglicemia: quando o açúcar desce demais
A hipoglicemia afeta sobretudo pessoas que fazem insulina ou alguns antidiabéticos. A descida repentina dos níveis de açúcar provoca sintomas muito característicos.
Sinais de alerta rápido
- Tremores
- Suores frios
- Palpitações
- Fome súbita
- Tonturas
- Irritabilidade ou confusão.
É importante agir rápido: ingerir uma fonte de açúcar simples e medir novamente.
Quando procurar o médico: sinais de alerta urgentes
Apesar de muitos sintomas de diabetes poderem surgir de forma discreta, há situações em que o corpo não está apenas a avisar, está a pedir ajuda imediata. Reconhecer estes sinais pode evitar complicações graves, sobretudo no caso da diabetes tipo 1 e de hipoglicemias severas.
Combinação de vários sintomas
Sede constante, idas à casa de banho muito frequentes, perda de peso rápida e cansaço extremo são um conjunto clássico de sinais de glicemia muito elevada.
Isoladamente, cada sintoma pode passar despercebido, mas quando surgem em simultâneo, o risco de uma descompensação é elevado. Esta combinação indica que o corpo já não está a conseguir controlar o açúcar no sangue e precisa de avaliação médica o quanto antes.
Sintomas em crianças e adolescentes
Nas crianças, tudo acontece mais depressa. Se um bebé, criança ou adolescente começa a emagrecer de forma inesperada, sentir muita sede e acordar várias vezes durante a noite para urinar, é motivo para agir rapidamente.
Estes sinais podem ser o início de uma diabetes tipo 1, que evolui de forma súbita e pode levar a cetoacidose diabética em poucas horas. Por isso, diante destes sintomas, a avaliação deve ser feita no próprio dia.
Vómitos, dor abdominal ou desmaios
Quando surgem vómitos persistentes, dor abdominal intensa, respiração acelerada ou episódios de confusão e desmaio, o corpo está a lançar um alerta sério. Estes sinais podem indicar o início de uma cetoacidose diabética, uma complicação grave, sobretudo na diabetes tipo 1, que acontece quando o organismo, sem insulina suficiente, começa a produzir ácidos em excesso para tentar obter energia.
Em pessoas que já fazem insulina ou certos antidiabéticos, estes mesmos sintomas também podem ser consequência de uma hipoglicemia grave, situação em que a glicose desce tanto que o cérebro deixa de receber energia suficiente. Nestes casos, podem surgir tremores, irritabilidade marcada, dificuldade em falar e, em situações mais avançadas, perda de consciência ou convulsões.
Perante qualquer um destes sinais, a regra é simples: não esperar para ver se passa. São situações que exigem observação imediata numa urgência hospitalar.
Como é feito o diagnóstico da diabetes?
Os sintomas levantam uma suspeita, mas o diagnóstico só é confirmado através de análises. O objetivo destes exames é perceber como o corpo está a lidar com o açúcar no sangue e se os valores estão dentro do normal.
Teste de Hemoglobina Glicada (HbA1c)
Este exame não olha para um momento isolado, mas sim para a média dos níveis de açúcar nos últimos dois a três meses. É uma fotografia alargada do controlo glicémico.
Valores iguais ou superiores a 6,5% costumam indicar diabetes. É um dos testes mais usados para diagnóstico e acompanhamento.
Ainda assim, é importante lembrar que a HbA1c pode ser influenciada por outras condições, como anemia, doenças hematológicas, gravidez ou alguns problemas renais. Por isso, a interpretação deste resultado deve ser sempre feita por um profissional de saúde, considerando o contexto clínico de cada pessoa.
Glicemia em Jejum
É talvez o exame mais simples e rápido. Depois de 8 a 12 horas sem comer, mede-se o valor de glicose no sangue.
- Normal: abaixo de 100 mg/dL
- Pré-diabetes: 100–125 mg/dL
- Diabetes: 126 mg/dL ou mais (confirmado em duas medições).
Este teste é muitas vezes o primeiro passo quando surge a dúvida: “Será que tenho diabetes?”
Teste de Tolerância à Glicose (TTOG)
Muito utilizado na diabetes gestacional, mas também útil noutros casos. O exame mede a glicemia em jejum, depois a pessoa ingere um líquido açucarado e, duas horas depois, faz nova medição. É fundamental que todo o procedimento seja seguido à risca ( jejum adequado, ingestão completa da solução e tempo de espera correto) porque, caso contrário, os resultados podem não ser fiáveis.
O objetivo é perceber como o organismo reage a uma carga concentrada de açúcar. Quando o corpo não consegue processar a glicose de forma eficaz, ela acumula-se na corrente sanguínea, e essa resposta é decisiva para confirmar ou excluir o diagnóstico de diabetes.
Teste de Glicose Aleatório
Ao contrário dos outros exames, este pode ser feito a qualquer hora do dia, com ou sem jejum.
Quando há sintomas evidentes como: sede extrema, urinar muito, cansaço intenso ou perda de peso, valores iguais ou superiores a 200 mg/dL são um forte indicador de diabetes e justificam uma avaliação imediata.
A diabetes não se resume a números ou análises: é uma conversa constante entre o corpo e quem nele vive. Ouvir esses sinais, mesmo os que parecem pequenos, é um gesto de cuidado. Quanto mais cedo se entende o que está a acontecer, mais espaço se ganha para viver com tranquilidade, escolhas conscientes e saúde. O primeiro passo é sempre simples: prestar atenção.
Os conteúdos deste blog são informativos. Não substituem diagnóstico ou tratamento médico. Consulte sempre um profissional de saúde.



